Em março de 2016, a então presidente Dilma Rousseff publicou medida provisória elevando de 20% para 49% o limite de capital estrangeiro em empresas aéreas brasileiras. Durante a tramitação no Congresso, o limite foi ampliado para 100%, mas, em julho, o presidente interino Michel Temer vetou este trecho. No ano seguinte, o governo mudou de ideia e enviou projeto de lei à Câmara, mas que avançou pouco. Por isso, quase no fim de seu mandato, Temer publicou a MP 863/18, abrindo o mercado ao capital estrangeiro. Essa medida necessária, que privilegia a liberdade e a concorrência no setor aéreo, acabou prejudicada pelo populismo na Câmara e no Senado, na recente corrida para votar MPs que estão prestes a caducar.
Em abril, a comissão especial de deputados e senadores que analisava a MP incluiu no texto a proibição da cobrança por bagagens despachadas nos voos, prática adotada em quase todo o mundo e que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) havia permitido em 2016. À época, alegou-se que isso permitiria a redução no preço das passagens, uma argumentação que ignorava um fato extremamente básico: a composição das tarifas leva em conta vários outros fatores que podem oscilar, como o câmbio e o preço dos combustíveis, além da própria dinâmica da oferta e demanda. No fim, a redução indevidamente prometida não ocorreu e, na esteira da indignação popular, os congressistas resolveram trazer de volta a “bagagem gratuita”.
Só há uma forma de oferecer serviços melhores a preços mais baixos para o brasileiro: aumento da concorrência e liberdade para fazer negócios
Mas a verdade é que não existe “bagagem gratuita”. Os custos que as empresas aéreas têm com o transporte das malas despachadas – e mais bagagem leva o avião a consumir mais combustível, elevando ainda mais a despesa – serão simplesmente distribuídos entre todos os passageiros, incluindo aqueles que viajam apenas com a malas de mão. Não há segredo algum aqui. Mas essa obsessão por gratuidades que só existem no nome tem o potencial de inviabilizar justamente aquilo que mais se esperava com a MP das aéreas: a entrada das empresas low cost (baixo custo).
O modelo de negócio das low cost consiste justamente em cobrar apenas pelo indispensável – levar um passageiro de uma cidade a outra –, cobrando adicionais por qualquer outra comodidade ou conveniência: despacho de bagagens, marcação antecipada de assentos, prioridade no embarque, refeições melhores ou até mesmo a oferta de refeições. É assim, por exemplo, que a Norwegian Air UK, aérea low cost que começou a operar voos entre o Rio de Janeiro e Londres, pode cobrar tarifas de pouco mais de R$ 1 mil por trecho. Se o país quer atrair mais empresas, que operem mais voos, precisa dar-lhes a liberdade para colocarem em prática o modelo que as torna viáveis. Quando o legislador impõe obrigações desnecessárias e indesejadas, espanta potenciais interessados em operar no Brasil.
Nossas convicções: Livre iniciativa
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Outro “jabuti” enxertado na MP por deputados e senadores quase arruinou a tramitação. A comissão especial havia aprovado uma exigência para as empresas com mais de 20% de capital estrangeiro: nos primeiros dois anos de operação no Brasil, elas deveriam operar pelo menos 5% de voos regionais. O plenário da Câmara derrubou a obrigatoriedade, irritando senadores do Norte e Nordeste, que ameaçaram recolocá-la na MP. Isso mandaria o texto de volta para os deputados, que não conseguiriam votar o texto até o fim da quarta-feira, fazendo a MP caducar. No fim, os senadores optaram por aprovar a versão vinda da Câmara, com o compromisso de que a exigência apareceria em um novo projeto de lei ou decreto presidencial. Agora, o texto vai para sanção do presidente Jair Bolsonaro, que pode até vetar o trecho referente à proibição da cobrança de bagagem, que voltaria ao Congresso.
Só há uma forma de oferecer serviços melhores a preços mais baixos para o brasileiro: aumento da concorrência e liberdade para fazer negócios. Quando o Estado passa a impor exigências sobre o que pode ou não ser cobrado, sobre que rotas as empresas devem operar – em resumo, sobre como entes privados devem alocar seus recursos –, ele intervém de forma desnecessária e destrutiva. Em nome do populismo que garante elogios rápidos e fáceis, e que explora percepções enganosas sobre serviços que não deixam de ter seu preço só porque um burocrata os declarou “gratuitos”, deputados e senadores colaboram para manter a falta de liberdade que faz o investidor estrangeiro hesitar diante da ideia de operar no Brasil. O mercado brasileiro não deixará de ser atrativo, mas, enquanto durar o intervencionismo na atividade econômica, jamais conseguirá desenvolver todo o seu potencial.
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